Por George W B Cavalcanti
Folheando os meus rascunhos de diversos gêneros como costumo fazer, qual não foi a minha surpresa senão encontrar os meus primeiros ‘rabiscos’ de A Réstia, um dos meus poemas mais apreciados. Naquele achado fui envolvido pela mesma emoção que me conduziu, outrora numa escalada de inspiração; do coração ao papel, depois ao computador e agora via ‘web’ até vocês. Naquele momento aconteceu que, por felicidade, me veio à lembrança um episódio ocorrido com o Dr. Jonas (nome fictício) um psicólogo e meu colega de trabalho no atendimento a adolescentes com dificuldades pessoais e sociais; jovens internos do NEAS, antiga FEBEM, cuja equipe técnica da unidade estadual eu coordenei, em Maceió, (cargo em comissão) durante um (1) ano – de 2004 a 2005 – mas, vamos ao relato.
Contou-nos ele que, clinicando foi procurado por um jovem casal apreensivo com os freqüentes diálogos imaginários da sua primogênita de nome Mona (assim a chamaremos aqui) que, segundo informaram-no, ocorriam entre a filha e personagens fictícios por ela inventados quase todas as manhãs entre as 10 e 11 horas. Segundo ele, os dois aflitos consulentes acrescentaram ainda que, o ‘fenômeno’, acontecia sempre junto a uma mesma janela da casa na qual moravam e, num canto pouco arejado que ela escolhera para recolher-se por momentos a fio em meio aos seus queridos brinquedos.
Frisou o nosso analista-relator que, os neófitos genitores, quase à beira de um ataque de nervos, rogaram-lhe que lhes salvasse a filhinha, pois temiam pela sanidade mental da sua ingênua e solitária ‘pequena tagarela’. Ao que o doutor, disse-nos, de pronto procurou acalmá-los assegurando a trivialidade desse tipo de ocorrência na infância; mas, como pareciam alarmados e insistiam, aceitou cuidar do caso.
Prosseguiu em seu relato dizendo-nos que, visitou a família em foco e após alguma observação comportamental da criança à distância, logrou aproximar-se da menina e foi surpreendido com um momento que considerou marcante na sua vida profissional e pessoal. Salientou que, em ocasião oportuna – após a sua pequena paciente anuir em compartilhar o seu exótico momento – e, com o adequado jeito, perguntou à menina: - ‘Moninha’, você está conversando com essa claridade que vem dessa janela? – e completou –, esse facho de luz chama-se réstia, sabia?
Continuando disse-nos que ela olhou-o bem nos olhos e, a seguir, com a sua linda mãozinha já estendida sob os raios de sol, corrigiu-o à sua maneira dizendo-lhe: - Não, ‘tio doutor’ (assim ela passara a chamá-lo), isto ‘é raios de anjos’ – e continuou –, são eles avisando que estão cuidando da gente; e, acrescentou: sabe o meu ‘vô Totonho’ que foi para junto de ‘papai do céu’; aquele que todo mundo dizia que ele era um anjo, ele está cuidando de mim agora!
A seguir o Dr. Jonas descreveu o sorriso que a pequenina estampara, olhando a luz e o vazio, como sendo: suave e enigmático. A associação com o da homônima historicamente famosa, transformado em um enigma por Da Vinci foi, imediata e inevitável. Enfim, salientou que prescreveu uma indicação para a criança; um remédio que eles mesmos, os pais, teriam que produzir e que era tudo o que o sintomático sorriso da Mona pedia: mais tempo e atenção a ela dedicados e, com urgência, elevadas doses de afeto, amor e muito carinho; concluiu.
Naquela feliz oportunidade estava reunida quase toda a nossa equipe técnica almoçando em torno de uma grande mesa. E, teria sido para nós apenas uma refeição a mais na rotina, não fora aquele repentino sabor salino característico e indefectível presente em cada boca. O gosto da lágrima; um suave tempero que, muito apropriadamente, acrescentou um toque todo especial aos últimos bocados deglutidos ali com resignado esforço, naquele inesquecível momento entre a dificuldade e o êxtase.
Concluimos que, tão marcante quanto, foi compartilharmos da sua rica e até poética experiência clinica; e, maior a lição que ali obtivemos: que, para nós adultos, é quase sempre inimaginável a importância indelével do afeto e seus agentes - especialmente mãe, pai, e, até mesmo um idoso avô - na vida de uma criança.
União dos Palmares - AL, 05 de julho de 2008.
Folheando os meus rascunhos de diversos gêneros como costumo fazer, qual não foi a minha surpresa senão encontrar os meus primeiros ‘rabiscos’ de A Réstia, um dos meus poemas mais apreciados. Naquele achado fui envolvido pela mesma emoção que me conduziu, outrora numa escalada de inspiração; do coração ao papel, depois ao computador e agora via ‘web’ até vocês. Naquele momento aconteceu que, por felicidade, me veio à lembrança um episódio ocorrido com o Dr. Jonas (nome fictício) um psicólogo e meu colega de trabalho no atendimento a adolescentes com dificuldades pessoais e sociais; jovens internos do NEAS, antiga FEBEM, cuja equipe técnica da unidade estadual eu coordenei, em Maceió, (cargo em comissão) durante um (1) ano – de 2004 a 2005 – mas, vamos ao relato.
Contou-nos ele que, clinicando foi procurado por um jovem casal apreensivo com os freqüentes diálogos imaginários da sua primogênita de nome Mona (assim a chamaremos aqui) que, segundo informaram-no, ocorriam entre a filha e personagens fictícios por ela inventados quase todas as manhãs entre as 10 e 11 horas. Segundo ele, os dois aflitos consulentes acrescentaram ainda que, o ‘fenômeno’, acontecia sempre junto a uma mesma janela da casa na qual moravam e, num canto pouco arejado que ela escolhera para recolher-se por momentos a fio em meio aos seus queridos brinquedos.
Frisou o nosso analista-relator que, os neófitos genitores, quase à beira de um ataque de nervos, rogaram-lhe que lhes salvasse a filhinha, pois temiam pela sanidade mental da sua ingênua e solitária ‘pequena tagarela’. Ao que o doutor, disse-nos, de pronto procurou acalmá-los assegurando a trivialidade desse tipo de ocorrência na infância; mas, como pareciam alarmados e insistiam, aceitou cuidar do caso.
Prosseguiu em seu relato dizendo-nos que, visitou a família em foco e após alguma observação comportamental da criança à distância, logrou aproximar-se da menina e foi surpreendido com um momento que considerou marcante na sua vida profissional e pessoal. Salientou que, em ocasião oportuna – após a sua pequena paciente anuir em compartilhar o seu exótico momento – e, com o adequado jeito, perguntou à menina: - ‘Moninha’, você está conversando com essa claridade que vem dessa janela? – e completou –, esse facho de luz chama-se réstia, sabia?
Continuando disse-nos que ela olhou-o bem nos olhos e, a seguir, com a sua linda mãozinha já estendida sob os raios de sol, corrigiu-o à sua maneira dizendo-lhe: - Não, ‘tio doutor’ (assim ela passara a chamá-lo), isto ‘é raios de anjos’ – e continuou –, são eles avisando que estão cuidando da gente; e, acrescentou: sabe o meu ‘vô Totonho’ que foi para junto de ‘papai do céu’; aquele que todo mundo dizia que ele era um anjo, ele está cuidando de mim agora!
A seguir o Dr. Jonas descreveu o sorriso que a pequenina estampara, olhando a luz e o vazio, como sendo: suave e enigmático. A associação com o da homônima historicamente famosa, transformado em um enigma por Da Vinci foi, imediata e inevitável. Enfim, salientou que prescreveu uma indicação para a criança; um remédio que eles mesmos, os pais, teriam que produzir e que era tudo o que o sintomático sorriso da Mona pedia: mais tempo e atenção a ela dedicados e, com urgência, elevadas doses de afeto, amor e muito carinho; concluiu.
Naquela feliz oportunidade estava reunida quase toda a nossa equipe técnica almoçando em torno de uma grande mesa. E, teria sido para nós apenas uma refeição a mais na rotina, não fora aquele repentino sabor salino característico e indefectível presente em cada boca. O gosto da lágrima; um suave tempero que, muito apropriadamente, acrescentou um toque todo especial aos últimos bocados deglutidos ali com resignado esforço, naquele inesquecível momento entre a dificuldade e o êxtase.
Concluimos que, tão marcante quanto, foi compartilharmos da sua rica e até poética experiência clinica; e, maior a lição que ali obtivemos: que, para nós adultos, é quase sempre inimaginável a importância indelével do afeto e seus agentes - especialmente mãe, pai, e, até mesmo um idoso avô - na vida de uma criança.
União dos Palmares - AL, 05 de julho de 2008.
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